Eu era uma um pré-adolescente imbecil, ridiculamente imbecil. E quando o assunto eram as mulheres, eu era imbecil no grau mil. Não sei como é que de vez em quando aparecia uma menina interessada em mim. Interessada o suficiente pra me mandar uma cartinha. Recebi algumas cartinhas na vida. Me lembro de duas da infância e pré-adolescência e algumas outras ali pelos vinte e poucos. Nunca entendi essa coisa de as mulheres escreverem pra mim, talvez fosse a intuição delas dizendo que para que eu as escutasse elas deveriam por no papel o que tinham pra dizer.
Eu estudava na Escola Básica Alberico Azevedo, em São Miguel do Oeste (SC), na sexta série. Na minha turma tinha uma ‘alemoa’ (era assim mesmo que a gente chamava as meninas com descendência italiana ou alemã) que era apaixonada por mim. Mas fazer o quê? Eu tinha 11 anos e era um completo bocó. Todo mundo na escola ria dela por levar de lanche sanduíche de pão com ovo e salame. Eram tempos difíceis aquele 1993 e todo mundo levava um pão com alguma coisa como recheio de casa. Eu também ria dela. Ela era mais alta e encorpada que todos nós da turma. Cabelos loiros longos. Era linda, sem dúvida, mas não era tão linda quanto uma moreninha trigueira, filha de um sargento, que morava na vila militar perto da escola. Todos eram apaixonados por ela, que não economizava amor, por sua vez. Diziam que até de mim ela gostava. Eu me envaidecia, óbvio. Não sei se era por isso que a alemoa não me despertava afeições mais profundas. Eu gostava dela. Acho que tinha medo de me aproximar. Receio do que os outros diriam, sei lá (eu avisei que eu era um bocó). A gente se mudou para União da Vitória no ano seguinte e nunca mais a vi. Hoje, aos 30 e poucos, deve estar deslumbrante, tenho certeza.
Em União da Vitória, no Colégio Túlio de França, caí de paraquedas numa sétima série cheia de meninas bonitas. Eu era o estranho ali. Eu já era fechado por natureza e me fechei mais ainda por me ver num colégio sem conhecer ninguém. Uma garota magrela, cabelos cacheados, toda certinha, gostava de mim, aparentemente. Eu só percebi isso na oitava série. Os outros guris do colégio já corriam atrás da meninada e eu só queria saber de jogar bola. Eu ia beijar nas férias no final daquele ano, mas poderia ter beijado ela, se eu fosse mais esperto. Ela passou a oitava série toda me mandando sinais. Me chamava de crânio porque eu sempre tinha as respostas para as perguntas dos professores, lia um livro por semana, às vezes dois, e tirava boas notas. Inclusive lembro de ter escrito um historinha de terror, ilustrado e feito um livrinho para expor na feira de ciências do colégio daquele ano. Fiz também um telégrafo, que não deu muito certo porque eu e meu colega não compramos o fio certo. Passando pela feira, com ela por perto, para ver as coisas expostas, ela apontou um vidro com um cérebro dentro e disse “Ó você ali!”. Interpretei isso como um elogio. Talvez a brincadeira fosse mais profunda. Meu cérebro estava ali, na mesa, e eu andava pelos corredores da escola com a cabeça oca. Vai saber…
Eventualmente uma garota acabou me agarrando e me beijando nas férias daquele 1994. Ela recém tinha descoberto como aquilo era bom, eu era um desconhecido, logo… Na festa de aniversário de uma prima, a mesma que tinha me apresentado à beijoqueira, conheci outra garota que estava interessada em me beijar (foi o que me disseram). Mas era festa de aniversário, a família toda ali, ela mostrava tanta vontade de me engolir que eu fiquei encabulado com aquela pressão e não beijei a guria. Ela era bonitinha (até onde me lembro), cheinha, usava aparelho, era risonha e divertida. É… nem sei como me desculpar.
Depois veio o ensino médio, e como todo adolescente bobo superficial, me interessava pelas gostosonas e esquecia das meninas da minha liga, meninas que caberiam no meu caminhãozinho. Fora que nessa fase eu tinha a impressão de andar com uma nuvenzinha de tempestade sobre a cabeça o tempo todo, como nos desenhos. Meu pai reclamava de tudo que eu fazia, eu era explorado num emprego de meio período, e bebia demais nas festas (quando me convidavam pra festas). Fiquei interessado por uma colega de classe. Ela tinha um cabelo estranho, mas era divertida e conversava comigo. Mas não consegui dizer pra ela o que eu sentia. Me coloquei no que hoje a moçada chama de friendzone. A gurizada tende a colocar a culpa na menina. É óbvio que a culpa era minha: o que eu esperava, que ela fosse me agarrar? Eu não era (e nem sou) tão bonito a ponto de despertar instintos primitivos nas mulheres. Depois de adulto (em que fiquei menos tímido) sempre tive que batalhar para ficar com alguém. Claro que eu não esperava que ela fosse fazer isso. Eu na verdade esperava pelo momento certo para dizer para ela o que eu sentia. Momento esse que nunca aconteceu, e ela visivelmente perdeu o interesse por mim e eu por ela.
No terceirão uma menina do primeiro ano passou a me dar um bolão. Era descarado o negócio. Sempre que nos encontrávamos no corredor um sorriso gigantesco explodia no rosto pequeno dela. Seus olhos me flechavam. Nada acontecia comigo. Eu não sabia o que dizer, o que fazer. Suponho que o problema fosse que eu a achasse feia. Ela tinha amigas bem bonitinhas, o que fazia com que meu foco de atenção se desviasse. Anos depois, uns 10, a encontrei em um supermercado da cidade, trabalhando como promotora de algum produto, desses que as mulheres oferecem para as pessoas nos corredores. Estava linda, absurdamente linda. Não creio que ela tenha me reconhecido por detrás da barba (tá, é um exagero chamar isso que eu tenho na cara de barba, mas vá lá, digamos que seja).
Claro que eu não tinha como saber que todas essas meninas que em algum momento da minha vida me deram mole viriam a se tornar mulheres lindas. Quem é que pensa nisso quando tem 12, 14 ou 17 anos? Eu não pensava. No final das contas eu acabei não ficando com muitas meninas durante a adolescência. Se eu fosse contar, daria umas duas por ano (sendo generoso comigo mesmo). O que para aquela época já era um fiasco. Imagine para os padrões atuais, em que a moçada vai pras festas e fica com várias pessoas na mesma noite. Tudo isso por quê? Por que além de ser fechado como um cofre eu era um mané superficial.